Sobre a paixão
(in Solidão Equilibrista , Edições UFC, 2008) De que serve a paixão senão para transmutar o dia em borboletas, ruídos em vagalumes, e nuvens em deuses, cometas, zumbis? de que serve a paixão senão para me envolver nessa nuvem de desejo e me transformar numa mulher esguia, leve, com idéias e desejos se desprendendo de minha alma como bolhas de sabão? de que serve a paixão senão para nos transformar um pouco? nos carregar com as suas vagas para o meio do mar, e nos abandonar lá, no escuro, sem vento e sem prancha? de que serve a paixão senão para ver a dor tomando todos os cômodos da casa? todos os poros das paredes, móveis, lençóis? escorrendo devagar por todas as frestas e ralos? de que serve a paixão senão para deixar este deserto maior do que o Saara dentro de mim? É assim: quando se vai a paixão resta um oceano inteiro a se navegar... O mundo se apresenta em vestes menos espalhafatosas; meio cinzento, meio rosa-clarinho, às vezes amarelo-pálido... breves visões de oásis... Eu, me ol...