No dia 13 de agosto, um dia antes de voltar ao Brasil, inspirada pelos comentários de Muad´Dib a postagens anteriores, escrevi a crônica “Um outro eu... mas qual?” Recebi vários comentários, mas um deles, o de Emma, provavelmente não foi compreendido por muita gente. Copio o que ela escreveu: “Lembranças... Berna, desde ontem à noite fiquei pensando em uma pegadinha que você me fez há uns 20 anos atrás... sobre uma paixão... e me veio à mente coisas desse tipo. Quem é quem no mundo de hoje? Quem é a criatura e quem é a criadora??? Seria divertido.”
Emma sugeria que Muad´Dib fosse uma criação minha. Recebi o comentário como um elogio. Ela sugeria que eu era uma ficcionista tão imbuída do seu papel que transformava em ficção a própria vida. Conto agora a história da “pegadinha” do jeito que me lembro para depois voltar a falar de Muad´Dib.
Longos idos meados da década de 1980. Estava me recuperando do final do namoro com Valdemar e dividia um apartamento com Emma C Siliprandi, em Campina Grande. As duas fazíamos mestrado em Sociologia na UFPB. Para ajudar a sarar a dor de cotovelo fiquei viajando mais sistematicamente para João Pessoa: pela praia, por Laís, pelos amigos Giovanni, Leo e Ana Tereza e o recém-conhecido, mas já querido, Roderick Fonseca. Emma estava me achando meio silenciosa, meio esquisita. Eu já não sofria mais tanto pelo final com o Valdemar e, portanto, já não queria falar mais disso. Acho que o que vivíamos no mestrado não rendia naquele momento conversas particularmente entusiasmadas.
Emma e outros amigos achavam que o melhor jeito de me libertar do final da história com Valdemar era entrar numa nova história. Havia até certa pressão nesse sentido... Um dia, após voltar de JP, Emma me perguntou: “Ei Berna, tudo bem?” Naquele exato instante comecei a lhe contar a história desse cara esquisito que eu havia encontrado em JP... Naquele mesmo dia, escrevi no meu diário sobre ele. Meu silêncio passou a ser sinônimo de concentração no cara e naquela paixão esquisita. Passaram-se várias semanas, várias idas a JP. Emma sempre me perguntava por "ele" e eu contava como as coisas estavam indo... As férias chegaram e Emma viajou por um mês inteiro . Quando voltou, estava ansiosa para saber sobre o meu “namorado”. E eu, completamente desprevenida, respondi: “que namorado?” Ela: "o teu namorado esquisito, guria!"E aí aquela história: a vida inteira para adquirir confiança e apenas um instante para perder. Eu me traí com a minha resposta. Havia esquecido a própria ficção. Tinha inventado a história do namorado esquisito porque achava mais fácil atribuir o meu ensimesmamento a ela do que às dúvidas e buscas.
Emma não me perdoava por eu ter “inventado” a história. E me olhava ora como a uma louca ora como a um monstro. Pelo jeito, até hoje não me perdoou. Enfim chego ao presente. A Muad´Dib e à hipótese de Emma de que ele também pode ser ficcional. Eu tenho certeza que é. Apenas não é cria minha, isto eu garanto. Não me sinto capaz de criação tão extraordinária, pelo menos não ainda.
Como Emma e outros leitores deste blog, também sinto muito a falta de Muad´Dib... Não sei porque ele sumiu, sei que foi imediatamente após a crônica em que revelo o impacto que têm os seus comentários sobre mim... Pois é, não sei porque sumiu... mas adoraria que voltasse...
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sábado, 23 de agosto de 2008
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