quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Brasileiras e samba em Chicago: modelando-se à luz do desejo do outro

(Este trabalho foi apresentado no Fazendo Gênero 8 - Corpo, Violência e Poder. Florianópolis, de 25 a 28 de Agosto de 2008. Disponível também no http://www.fazendogenero8.ufsc.br/sts/ST65/Bernadete_Beserra_65.pdf)


Taís descobriu-se sambista por acaso. Convidada por um irmão recém-chegado de Londres, aventurou-se a sair de Mount Prospect à noite para uma visita ao Mad Bar, onde o Chicago Samba se apresentava às quintas-feiras. Acostumada à sua vida mais tranquila e confortável no subúrbio, Chicago era, até então, algo distante, que não fazia muito parte da sua vida, a não ser durante o período de fim de ano, quando vinha com amigas olhar as luzes e a decoração natalinas.

Da primeira dessas visitas, um trauma. Estacionou o carro numa das ruas que desembocam no Lago Michigan e quando voltou para pegá-lo, ele havia sumido. Foi assim aprendendo as regras daquela cidade bonita, mas intrigante. Inóspita? Não, hoje ela aprendeu que não e não consegue acreditar que não viu aquela placa de estacionamento proibido ali, no Jackson Boulevard, a um quarteirão do lago.

Feliz de reencontrar naquele bar e no Chicago Samba um pouco de Brasil, começou a dançar. Mas era esquisito estar dançando samba. Embora carioca, nunca gostara de samba. Gostava de rock. E de frevo e forró, quando visitava a família da sua mãe no nordeste. Surpreendeu-se quando Mara, mulher de um dos componentes da banda, aproximou-se elogiando sua performance: você dança muito bem! Antes de compreender a extensão do significado do elogio, foi surpreendida com o convite:

– Você não quer fazer um show com a gente?

– Eu? Dançar pelada? Não! E de biquini também não!!

Mas Mara logo explicou que era um show de carnaval, com fantasias. E Taís foi. Ganhou 150 dólares para dançar menos de duas horas. Como não havia se dado conta dessa possibilidade antes? Shows privados, como aquele, eram esporádicos, mas havia o Chicago Samba ali, no Mad Bar semanalmente. Começou a dançar para o grupo em 1996, quando sua única filha não tinha completado ainda o seu primeiro ano de vida. Logo começou a receber convites para outros shows e a também confeccionar as suas próprias fantasias. Afirma, orgulhosa, que pouquíssimas vezes precisou usar biquini: “usava sainhas, maiôs com lantejoulas...” O negócio foi crescendo na mesma medida em que seu casamento foi desmoronando. Começou a viajar para o Brasil para comprar mais fantasias. Mas aí o Chicago Samba decidiu dispensá-la. Alegaram que ela estava aparecendo mais do que eles e que não apreciavam a idéia de que uma banda de músicos se tranformasse numa banda de “tchan”. Ficou arrasada, sem saber o que fazer com tanta fantasia! Mas ficou especialmente triste porque aquele show estava se transformando na sua razão de viver. Seu casamento estava uma monotonia insuportável. Não aguentava mais o seu marido americano, preguiçoso, conservador, sem planos para o futuro e concentrado apenas na televisão e na cerveja. Continuou indo para a apresentação semanal do Chicago Samba, mas não mais vestida em fantasias carnavalescas. Apesar disso, continuou a receber convites para dançar em festas privadas.

Assim inicia a história de dançarina de Taís, semelhante à de várias outras brasileiras que se envolveram com o mundo do samba em Chicago. A diferença é que Taís dança e promove a cultura brasileira em Chicago há mais de uma década e isto é extraordinário num negócio em que a rotatividade é tão grande. O samba surge como um interesse de passagem na vida de muitas brasileiras ou não-brasileiras que com ele se envolvem. Talvez porque não reivindica dessas dançarinas mais do que algumas horas de dedicação semanais, o samba é muito diferente da bossa-nova e da capoeira que, mais exigentes, requerem quase uma conversão. Mas um dos problemas da continuidade das mulheres no negócio do samba são os maridos. Eles não querem suas mulheres se expondo publicamente, jogando charme para um público indistinto. O comum, portanto, é que as mulheres fiquem com o samba até encontrarem marido. Raros os casos dos que não se incomodam, que vêem a dança como um trabalho, uma arte.

Após o divórcio, Taís veio morar no que ela afirma que é o quadrilátero de Chicago que mais concentra brasileiros. Da Grand Ave à Irving Park e da Lake Shore Drive à Cícero. Taís é empresária de um negócio “étnico” numa cidade em que praticamente não há demanda étnica porque a população brasileira é muito pequena. O censo americano calcula que há em torno de cinco mil brasileiros entre Chicago e arredores, mas o Ministério das Relações Exteriores apresenta um número maior, quase o dobro. Ela garante que a realidade está mais próxima da estimativa americana. Além de artista e de empresária do samba, trabalha com a promoção de shows e garante que tem uma idéia bastante razoável da população brasileira na cidade: quatro mil permanentes e dois mil flutuantes.

Tendo sido casada com um americano branco por quase uma década e morando no midwest por mais de duas, Taís garante que conhece a cultura americana; que sabe como promover a cultura brasileira num ambiente conservador como aquele. Não é simples, não é fácil. Lembra de episódios dramáticos que estão na base do seu aprendizado: num dos primeiros shows que dançou de biquini assistiu assustada uma platéia de quatrocentas pessoas ir embora. Somente restaram a banda e as dançarinas desapontadas.

- Eu havia sido contratada pela Leda. Não era um show que eu estava agenciando. Mas eu jurei pra mim que nunca mais faria aquilo: eu vou apagar essa imagem! E o problema desses grupos de samba que há por aí apresentando mulher pelada é que isto assusta as pessoas, ninguém contrata mais. E o meu show não. Eles gostam: querem mais. E por que escolhi este lado? Porque a mulher brasileira é muito mal vista: toda vez que se fala em mulher brasileira a imagem que vem é mulher pelada na avenida. Então, o meu trabalho tenta fugir um pouco dessa imagem, desse trivial de mulher pelada com uma pena na cabeça. Inclusive ratificar essa idéia é muito mais simples, muito mais barato: um monte de biquininhos e mulheres rebolando com penas na cabeça. Só que aqui na região não ia vender nada, que aqui não vende isso! A gente tem que entender muito da cultura deles para trabalhar aqui. Eles são super exigentes, super pontuais, muito conservadores, rigorosos demais com o nosso comportamento durante o show. Se você não sabe se comportar, você não tem business aqui.

Há doze anos trabalhando na expansão do mercado cultural brasileiro em Chicago, Taís compreende bem sua economia política e geografia. O samba, a dança, acompanha o samba, a música. Podem, porém, existir independentes um do outro. Há várias possibilidades de trabalho no mercado: shows em bailes de Gala, shows acompanhando grupos musicais, shows privados e as aulas de samba. Os shows em bailes de Gala apresentam características semelhantes às dos desfiles carnavalescos no Brasil: o foco é a fantasia e as suas cores, brilhos e ilusões. Em geral apresentam-se várias dançarinas. Os shows acompanhando grupos musicais são menores, duas ou três dançarinas resolvem. Aqui, a sedução e o carisma são as moedas mais comuns. Os shows privados têm formatos variados em função do tamanho e das características da festa. Tanto podem ser oferecidos a quatrocentos pessoas, num clube, como a vinte, num apartamento. O contratante é quem determina o que quer: se mais desfile de fantasia ou se mais requebros, biquinis e olhares, o que relativiza a afirmação de Taís de que a dupla biquini-requebro assusta o midwest. De fato, observando a variedade de possibilidades que ela própria apresenta, vê-se que há público para tudo. O que é necessário, e isto ela parece compreender bem, é perceber o que é adequado para cada ocasião. Já as aulas variam bastante em função do professor: do seu sexo, do seu público e da sua concepção de samba e de mercado.

Pela sistematicidade do encontro e pela proximidade que se estabelece entre professor e aluno e entre alunos, a aula de samba é o espaço em que as relações mais profundas e permanentes se desenvolvem no mundo contagiante, etéreo e ilusório do samba nesse mercado étnico. É nas aulas que as idéias de Brasil e brasilidade superficialmente apresentadas nos shows são demonstradas na prática. É nelas que a alegria que os brasileiros garantem que possuem é posta à prova das intempéries.

Aos poucos Taís foi tornando-se conhecida em Chicago e ocupando espaços mais visíveis. De dançarina do Chicago Samba e de festas privadas, foi convidada a oferecer a aula de dança brasileira no Chicago SummerDance, festival de dança que geralmente inicia na segunda semana de junho e vai até a última semana de agosto e apresenta aulas de dança e música ao vivo do mais tradicional swing até os mais exóticos forró e zydeco, passando pela salsa, bachata e merengue, mais populares em função da significativa população latina na cidade. Foi trabalhando para o departamento de assuntos culturais da prefeitura de Chicago, que Taís foi convidada a dar aula de dança brasileira no Old Town School of Folk Music, tradicional escola de música e dança fundada em 1957 e famosa por ter promovido a carreira de muitos artistas folk notáveis.

- Eu estava dirigindo um workshop oferecido pela prefeitura nas promoções culturais da virada do milênio. A mulher do Old Town School foi atrás de mim porque o meu workshop estava atraindo a atenção de pessoas que estavam noutros workshops... Eles saíam e iam pro meu... E não parava de entrar gente! Aí a mulher foi olhar e ficou no fundo da sala olhando e viu todo mundo dançando, todo mundo rindo, brincando... Aí quando terminou a aula ela foi falar comigo e me propôs dar aula.

Taís deu aulas no Old Town School of Folk Music durante quatro anos e de lá guarda memórias e amigos:

- Era um sucesso! Eu passava e as pessoas perguntavam: ah, é você a brasileira que está dando aula aqui? E eu, “sou eu mesma”. E eles me reconheciam também porque eu estava sempre vestida de Brasil, com um shortinho de lycra. Aí vinham umas querendo dançar com aquelas saias longas e eu dizia, ah não. Você não pode tomar aula de dança comigo com essa saia porque eu preciso ver suas pernas! Tem que por um short! Elas resistiam dizendo que estavam gordas e eu dizia: ah, aqui não tem esse negócio de gordo não, a gente é brasileiro, ninguém tá prestando atenção a isso não. (grifo meu). Aí iam botando uma bermuda mais curta... e no final estavam usando shortinho de lycra igual ao meu... Eu dei aula uns quatro anos... Houve alunos que nunca deixaram de fazer as minhas aulas! Saíam do trabalho cansadésimos, mas para eles ir para a minha aula era como tomar uma dose de vida! Agora mesmo eu tava falando com uma amiga de Trinidad &Tobago, que era minha aluna e que quando chegou na minha aula não conhecia ninguém, vivia depressiva e levava o filho lá para umas aulas não sei de quê e um dia viu: Brazilian Dance. E se matriculou. E lá fez um novo ciclo de amizade, a vida dela mudou da água pro vinho e ela começou a ter prazer em viver em Chicago, que ela veio do Canadá e não conhecia ninguém aqui. Então era um meio de promover conexão entre pessoas sozinhas, inclusive eu, que era sozinha também!

As aulas e os shows públicos ou privados foram a experiência que permitiu a Taís o desenvolvimento da consciência que hoje tem sobre feminilidade, beleza, sedução, brasilidade e americanidade.

- O Brasil ensina duas coisas: a alegria de viver. O brasileiro é um povo feliz, é um país do terceiro mundo, com mil problemas, mas é um povo feliz e contagiante. A outra coisa é a liberdade de se sentir à vontade com seu corpo... A liberdade de se sentir mulher, bonita! De que é normal usar uma jóia, uma bijouteria, usar sapato alto, usar decote, mini-saia. Pode usar! É bonito, te faz bem! Não é promíscuo, é natural. “Ah, eu tô gordinha...” Não tem problema! Você tampa aqui e mostra ali. Tampa o que não quer mostrar. Ensinar samba a essas mulheres é reensinar o feminino, é mostrar que existe uma mulher dentro delas, que são mulheres oprimidas, que nunca viram, nunca usaram, nunca foram ensinadas essa feminilidade. E vendo a gente tão à vontade, elas aprendem, mudam!

Taís, Denise, Lauren, Jeannie, brasileiras e não-brasileiras igualmente concordam em relação à metamorfose que o samba promove em suas vidas. Descobrem-se fortes, bonitas, sedutoras. O samba é um espelho e um escudo: é uma passagem para territórios desconhecidos e sedutores e oferece a proteção “étnica”. É sempre possível relativizar ou oferecer outras interpretações sobre o que foi apresentado em público, afinal o mundo do samba não começa e termina no Rio de Janeiro. “Tem samba de todo jeito e em todo canto do Brasil”, diz Taís.

Todo mestre tem consciência da possibilidade de ser superado pelo discípulo e no mercado do exotismo cultural isto não deveria ser uma exceção. De fato não é, mas a preferência de Taís é pelas brasileiras. Embore ensine samba quase que exclusivamente a não-brasileiros, nos seus shows as brasileiras têm primazia:

- Escolho brasileiras porque o pessoal tá comprando um produto brasileiro e eles querem ver a brasileira! Eles sabem que é diferente! A Sarah passa por brasileira, mas Robin não. A Sarah já estava dançando antes do Jorge chegar! Já é quase brasileira, só falta visitar o Brasil. Mas, veja, o que é que eu tô procurando numa dançarina? Primeiro se sabe dançar! E em segundo lugar, procuro pessoas que tenham algum tipo de pigmentação na pele para se misturar mais fácil com a gente... Quem contrata a gente tem um bom conhecimento do que é a mulher brasileira. E eles exigem: eu só quero mulher brasileira. Aí eu pego Ana, Dedé, às vezes a Sarah vai... O problema é que não tem muita dançarina brasileira aqui... elas vêm só de passagem, vão embora logo... Ou casam. Mas eu procuro sempre primeiro a brasileira. O cara tá comprando um produto do Brasil! Às vezes tenho que levar não-brasileiras e eles reclamam: eu não disse que era só pra trazer brasileira? Eu tinha uma aluna, a Ingrid, da Guatemala, dançava muito bem. Era supermagra e não tinha o corpo de brasileira, mas tinha a pele morena e dava pra passar por uma brasileira magra. Dançava superbem, como qualquer brasileira, mas não tinha o carisma! Não tinha a brincadeira, não tinha aquela coisa de olhar para a platéia e fazer a brincadeira, porque tem que ter isso no samba! E essa coisa de contagiar o público é só a gente que sabe, porque as americanas, e mesmo as outras latinas, não entendem disso! A Sarah sabe porque aprendeu com a gente... A americana não tá acostumada a olhar no olho... Existe um bloqueio... A Robin foi ao Brasil, já voltou mais abrasileirada, já deu uma quebradinha naquela parede que era ela... É um amor de pessoa, mas ainda tá faltando bastante coisa pra ela entrar no nosso pique!

O grupo de sambistas mais permanente em Chicago é, portanto, aquele que se organiza em torno de Taís. Até a sua entrada no mercado, o samba em Chicago se resumia aos bailes carnavalescos anuais no Hilton, organizado pela Gladys, Jimmy e Assir. Eram bailes elegantes, onde todos iam de fantasia e a orquestra tocava de terno e gravata. A entrada, com jantar incluído, custava entre 60 e 70 dólares, o que era um preço consideravelmente alto para a época, década de 1980. Não era um carnaval para brasileiros porque não havia brasileiros em número suficiente para tal empreendimento: era para americanos de classe média-alta e ricos. Nesse período também surgiam aqui e ali, convites para a apresentação de dançarinas em festas privadas. Mas Taís garante que foi a partir da última década que o mercado do samba evoluiu para o que é hoje e insiste que tal evolução está diretamente relacionada ao seu trabalho.

Trabalhando com um “produto” altamente instável, Taís tem sempre o cuidado de atrair para o seu grupo aqueles dançarinos e dançarinas em quem enxerga potencial artístico e também, claro, potencial concorrência. Reconhece que embora ainda pequeno, o mercado do samba em Chicago se expandiu muito desde que nele entrou e continua se expandindo, embora tal expansão esteja meio incerta agora com a crise econômica consequente da guerra do Iraque. Mas sendo um mercado limitado precisa de cooperação entre todos que dele participam.

É razoável se esperar que algumas dançarinas, brasileiras e não-brasileiras, contrariadas com o monopólio existente, de vez em quando se lancem na conquista do próprio mercado. Taís insiste que é um empreendimento complicado, que elas não fazem idéia: é preciso entender de samba; das regras do mercado cultural em Chicago; da compra, fabricação e manutenção de fantasias, mas, além de tudo, é preciso também ter os contatos que ela conquistou ao longo de mais de uma década de trabalho e dedicação. Ela provavelmente está certa, mas nem todas as dançarinas aceitam as suas regras e o seu monopólio e se lançam no desbravamento do mercado. Pelo que se observa e se narra, poucas persistem. Um dos seus trunfos mais fortes é a autenticidade: ela é brasileira e suas dançarinas também. Não parece ser apenas uma justificativa étnica, política, afinal ela reconhece que Sarah, americana branca, está aprendendo o jeito, a ginga, o carisma. Mas leva tempo e é preciso ter humildade para se submeter ao aprendizado. E isto nem todas aceitam. Mas é interessante observar que há grande camaradagem entre ela e as outras duas dançarinas brasileiras que também dão aula em vários locais da cidade e, como ela fazia antes, também oferecem workshops. Elas todas se apóiam.

Observo, porém, que nas apresentações do Chicago Samba há sempre mais dançarinas não-brasileiras, americanas. Taís explica que o cachê é muito baixo; que não compensa sair de casa pelo preço que se oferece. As americanas vão porque estão ainda conquistando o mercado, não precisam do cachê e vão acima de tudo para se divertir, sair de casa, paquerar. Ela tem mais o que fazer: está interessada também na produção de shows de artistas brasileiros em Chicago. Acredita que é um grande mercado inexplorado. Estabeleceu boas relações com os coordenadores dos grandes eventos étnicos que têm a ver com o Brasil em Chicago: o African Festival of Arts e o World Music Festival. Também conseguiu estabelecer uma relação de trabalho e cooperação com o International Latino Cultural Center of Chicago, que é uma entidade que promove a arte latina na cidade. Queixa-se da falta de apoio do governo brasileiro e também de entidades que se utilizam da marca Brazil para conseguir verba para a promoção da comunidade, mas efetivamente promovem apenas os seus dirigentes.

A breve história apresentada aqui permite ao leitor enxergar as tantas metamorfoses vividas por Taís no seu trabalho com o samba em Chicago. Observa-se claramente o modo diverso como lida com os seus alunos e os contratantes dos seus shows, ou mesmo o que há por trás do seu conceito de samba e mulher quando defende que as brasileiras são as únicas que sabem contagiar o público. Com as alunas sente-se mais à vontade para universalizar a sua concepção do que é ser feminina que, inclusive, vende como brasileira. Embora em qualquer espaço pairem sempre os limites da cultura protestante dominante, ali, na sala de aula, o seu poder é maior.

Durante nossa conversa não percebi essas contradições que aparecem tão claramente agora. Afinal, o que ensina sobre beleza feminina e feminilidade às suas alunas não parece ter muito a ver com o que aprendeu nos shows para os “americanos conservadores do midwest”. Ali, naqueles shows, aprendeu a contenção, o limite. Nada de exaltar tão obviamente a sensualidade: ali é mais espaço para a alegria, cores e sonhos das fantasias carnavalescas. Na hora de defender a necessidade de contratar somente dançarinas brasileiras para os seus shows, outra vez o seu aprendizado sobre o midwest americano é posto de lado e emerge outra compreensão de feminilidade agora completamente imbricada com a sua experiência de gênero e de Brasil, mas também com o que imagina que é o desejo do homem solteiro, consumidor do samba em Chicago. Deixo que ela própria conclua:

- Dançar, todo mundo dança, agora contagiar, tem que ser brasileira! Tem que ter contato visual com eles, olhar nos olhos deles... Eles têm que sentir que você sabe que eles estão lá. Tem que olhar para cada um deles e cada um tem que ver e sentir que você está olhando... Eles dizem: “ela está prestando atenção em mim... Está olhando pra mim...” E eles ficam pirados com isto!

3 comentários:

Emma disse...

Quando eu crescer, quero escrever que nem você! beijos, Emma

Anônimo disse...

Pode crer Emma. Eu também quero escrever assim quando crescer. Aliás Emma...é um prazer orgásmico reencontrar você aqui. Sim porque não pode ser outra que não a Emma que conheci com raladuras de queda de moto e tudo. Beijos!

Emma disse...

Lucia, eu também te reconheci, li teu poema - que diz tanto a todas nós, que aproveitamos o sono das crianças para poder pensar na vida - e me emocionei de pensar que estávamos nos re-encontrando outra vez, tanto tempo depois... Vi também que Claudinha anda por este espaço... veja só, o que faz um blog, ou o que fez este blog! Tenho tido muitas surpresas agradáveis, e esses sentimentos me alimentam e me confortam. beijos também!