O verso do título é de Gregório de Mattos, meados do século XVII e, em vez de Fortaleza, lia-se “Triste Bahia”. Mas é Fortaleza e as suas dessemelhanças (e inospitalidade) que me motivam agora, tempo de campanha para prefeito, a escrever um pouco.
Vejo, sinto e me angustio todos os dias com as dessemelhanças em Fortaleza. Elas se expressam dos mais diversos modos e circunstâncias, mas é ao tráfego que me dedicarei aqui. Todos os dias me coloco no lugar dos pedestres que têm de atravessar a BR-116 à altura da Aerolândia. São milhares de trabalhadores que cotidianamente, no início da manhã, se arriscam entre os carros em alta velocidade para não chegarem atrasados nos seus empregos.
Não tenho a estatística dos mortos, mas certamente aquele é um dos nossos mais importantes “pontos de óbito”. Do trecho que me concerne, viaduto da Oliveira Paiva, até a rotatória da Aguanambi, há apenas uma passarela. Isto já seria, em si, uma agressão àqueles trabalhadores. Mas a dessemelhança, o paradoxo, a loucura mesmo, tornam-se ainda mais visíveis quando observamos o espetáculo seguinte: no centro da rotatória da Aguanambi há uma praça que eu não creio que seja utilizada por mais de 10 pessoas por dia. Para falar a verdade, passo ali em diferentes horários do dia e jamais vi uma única pessoa!
Curiosamente há ali uma passarela. Uma passarela enorme, esquisita, provavelmente cara, ligando nada a lugar nenhum e, logo ali do lado, quilômetros de BR-116, com pesado tráfego de pedestres, sem passarela nenhuma. Acho particularmente curioso o fato de que a tal passarela para a praça da rotatória tenha sido construída no governo de Luizianne Lins. Não é interessante que com uma política supostamente voltada para os pobres, questões graves como essa não sejam resolvidas? Será a passarela para a praça fantasma da rotatória um dos monumentos da lista dos necessários à construção da Fortaleza “bela”? Não seria de outros slogans e ações que precisamos?
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
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5 comentários:
Na verdade aquela praça não foi feita por orgãos públicos, ela foi feita e é mantida por alguma empresa que não me recordo agora.
Bernadete,
Passarelas e passarelas
Fazia um tempinho, né.
Há passarela do samba e da moda; há passarelas acolhedoras que conduzem os pedestres até a beira certa. Há passarelas que não conduzem em nenhuma parte. Há passarelas meramente narcìssicas que são apenas afirmação de poder, marcas dum consenso mole. Há passarelas que não servem a ninguém; apenas são uma forma de provocação para o povo que não tem direito de emprestá-las; que se aparentam à miragem, cada vez mais afastada, do respeito da sua dignidade que os políticos manipulam com eficácia e cinismo.
E há outras passarelas. Aqueles livros de poesia (Solidão Equilibrista, por exemplo) que oferecem verdadeiras avenidas entre os corações, as almas dos seres humanos. Aquele fino fio sobre o qual a autora de Solidão Equilibrista dança e brinca com as palavras da emoção, dos não-ditos, dos mal-ditos, do pudor, da inconveniência, da espontaneidade juvenil, da mulher que os anos, as provas da vida, os amores e as suas decepções, nunca deixaram desprovida de humanidade, de brilho, de nobreza, de humildade e daquela borbulhante vivacidade.
Há outras passarelas, também, das quais você pertence, com certeza; aquelas mulheres-passarelas, luminosas, que incitam os homens a tornarem-se melhores; que os guiam numa forma de renascimento; que os conduzem a outros estados de consciência; que os abrem a outras formas de ser, de sensibilidade e de envolvimento; que os encorajam a entregarem-se sem armas, sem màscara, sem disfarce.
Obrigado por existir como você é, nesse blog, e como te imagino na vida real, mulher-passarela de Sumé.
Muad’Dib
Profª Bernadete Beserra,
Li com bastante atenção o seu artigo no jornal O POVO de hoje. Dou toda a razão à senhora antropóloga e seu ponto de vista. O fortalezense hoje está acuado onde quer que se dirija. As praças públicas, as calçadas, as praias e os mais variados espaços públicos estão sendo privatizados, seja com vendedores ambulantes (praças), seja para estacionamento de carros (clínicas, mercantis, etc), seja barracas, restaurantes e hotéis (praias).
Daqui alguns dias a população de Fortaleza terá que andar pelas ruas disputando o espaço com os carros, logicamente, em total desvantagem.
No exemplo citado pela senhora, a BR 116, altura do Bairro Aerolândia, não é só alí o único trecho perigoso da rodovia. Até as proximidades da Polícia Rodoviária Federal, a rodovia oferece um extremo perigo a quem tentar sua travessia.
Quando a Rodovia BR 116 foi alargada (construída), obra esta finalizada por volta de 1986 a 1987, aproximadamente, os recursos já estavam garantidos pelo regime militar, que acabara de deixar o poder.
Pois bem, a citada rodovia seria uma das mais modernas do Brasil, com obras de paisagismo de BURLE MARX., e o que se pode observar é que essas obras jamais foram realizadas.
Logo após a Polícia Rodoviária Federal, no sentido Aguanambi - Messejana, se a senhora perceber, tanto do lado esquerdo como do lado direito da rodovia, existem dois pilares altíssimo, que é para servir de sustentação a outra passarela, e nunca a construíram.
Mas o problema maior da BR 116 se deve a dois importantes fatores:
1 – Ao grande crescimento urbano dos bairros da zona sul de Fortaleza como Cidade dos Funcionários, Messejana, Pedras, Santa Maria, Lagoa Redonda, Sabiaguaba, Precabura, Sapiranga, Parque Manibura, Ancuri, Paupina e, estendendo-se até ao vizinho Município de Eusébio, onde já existem grandes condomínios residenciais, cujos moradores antes residiam em Fortaleza.
2 - Em virtude dessa expansão imobiliária, as vias de acessos não acompanharam o crescimento da cidade e nem ao volume do tráfego de carros, ocorrendo assim, demasiados congestionamentos.
Professora Bernadete, reflita comigo: se nós estamos no Center Um, na Avenida Santos Dumont e queremos nos deslocar à Messejana, nós só temos três opções de acesso, que são as seguintes:
a – Avenida Aguanambi via BR – 116;
b – Avenida Desembargador Moreira via Avenida Raul Barbosa que despeja seu trânsito, também na BR 116;
c – Avenida Santana Júnior via Avenida Washington Soares.
Somente essas são as três vias de escoamento do tráfego para uma quantidade enorme de veículos que se deslocam rumo à zona sul da cidade, o que nos leva a crer que a solução está na abertura de novas avenidas paralelas as três vias citadas, com a finalidade de descongestionar o trânsito, dando assim, maior vazão ao crescente número veículos naquela área da cidade. Se isso não acontecer, dentro de 4 anos, aproximadamente, as três vias de acesso estarão completamente saturadas. Aí, então, veremos o caos urbano.
Quanto àquela Praça, a Manuel Dias Branco, projetada para homenagear o genitor do proprietário da Fábrica Fortaleza, o Sr. Ivens Dias Branco, não pode ser considerada uma praça, e sim, apenas um marco, uma rotatória, pois as características de uma praça é justamente a presença de pessoas em seu espaço.
E tem mais um detalhe, o Bairro Dunas (nome original, bonito, poético e bem ecológico), nas proximidades da Praia do Futuro, já não se chama mais Bairro Dunas. Agora, a denominação oficial é BAIRRO MANUEL DIAS BRANCO, ou seja, uma dupla homenagem, quando existem tantos outros nomes que poderiam ser homenageados. A notícia eu li na coluna do Jornal O POVO, denominada “O POVO NOS BAIRROS”. Inclusive um leitor estava a reclamar de dificuldade em orientar-se, devido a inexistência de placas indicativas com a denominação das ruas.
Professora Bernadete, o que me levou a escrever para a Senhora foi sentir sua preocupação com Fortaleza.
Eu também me preocupo muito com Ela, inclusive com a conservação e preservação do seu Patrimônio Histórico.
TORQUATO PRISCO
Historiador
Berna, como já tive a oportunidade de dizer a você pessoalmente - e agora digo "em público" - estou revoltada com o abandono ao blog. Há mais de um mês você não aparece por aqui. E eu sei - porque "el mundo es un pañuelo", como dizem os espanhóis - que houve lançamentos de livros, houve recitais públicos de poesia, etc. - e nada disso está aqui! Blog só serve para chorar as pitangas??? A trabalhar, a trabalhar... não nos abandone, já estamos "blog-adictas"! Beijos.
Berna. Uma tristeza vez Fortaleza assim descrita por voce, Parece o Rio de Janeiro piorado, mais esculhambado ainda do que aqui já está e ainda sem Cristo Redentor, Baía de Guanabara, Pão de Açúcar etc... pra contrabalançar. Só o grande amor que se tem pelo nosso Rio nos faz tolerar tanta sujeira, tantos desmandos, tantas mortes inuteis. Daqui, de longe, ao ler as coisas sobre Fortaleza, me imaginava indo para lá, ter um refrigério para os olhos e para a alma e você me passa toda essa desolação, toda essa falta de respeito pelos pobres, tônica geral de nossa política. Uma faísca restante da minha juventude me mareja os olhos de tristeza e acende meu coração de revolta. Vontade de pegar numa arma e sair matando, de um em um, os reponsáveis? Mas... quem são os responsáveis? Tomara que teus augúrios aquarianos para 2009 se realizem , principalemnte nessa área e que nosso país, como um todo, seja mais digno, mais honrado, menos dessemelhante entre seus cidadãos. Beijos triste da circe
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